Entre os dias 24/02 e 02/03, uma equipe com cerca de 14 pessoas de diversos países da América Latina, que compõem a Articulação Continental Latina-americana e Caribenha das Comunidades Eclesial das CEBs, reuniu-se em Bogotá, na Colômbia para pensar a caminhada das CEBs no Continente.
Como construção coletiva, estão disponibilizando ao Povo de Deus uma síntese da identidade das CEBs, recolhida de seu caminhar nas últimas décadas. No texto, alguns princípios que demarcam a identidade das Comunidades Eclesiais Base. São princípios gerais que devem ser pensados de forma flexível em cada uma das realidades nas quais este processo de Igreja se encontra presente. É assim que eles devem ser lidos.
As CEBs são células iniciais de estruturação eclesial (Medellín 15,10) e são a Igreja sacramento (LG 1 e 26); procuram ser fieis à missão que Jesus Cristo nos deixou. Em comunidade “partilhamos o pão”, memória viva na base da igreja e da sociedade, com profundo sentido de participação sinodal (Vaticano II).
Segue o texto na íntegra
As CEBs seguem Jesus de Nazaré, aquele que “sendo de condição divina se abaixou e se fez escravo” (Fl 2, 7), e vivendo sua condição humana na realidade pobre da Galiléia, realizou sua missão sempre em saída. (Mc 1,10.38; 13, 1)
O centro da missão de Jesus Cristo está no anúncio do Reino de Deus. Jesus indica que o Reino está no meio de nós e caminha até a plenitude. Anuncia sua presença com sinais: a inclusão dos marginalizados, o amor acima da Lei e a defesa irrevogável da vida (Mc 2, 1-3,6). Esses princípios configuram o projeto de vida de Jesus de Nazaré em fidelidade ao Pai e ao impulso do Espírito. As comunidades afirmam seu desejo e prontidão para seguir o mesmo caminho.
São convocadas por Jesus para formar comunidades de irmãs e irmãos, fraternas, sororais e solidárias, buscando dignidade de vida para todas e todos. Como Ele, querem estar no meio aos pequenos e a partir daí realizar sua missão.
O ser da Igreja (At 2, 42-47) e portanto das CEBs, é ser uma comunidade missionaria, revelando a todos os povos e em todos os tempos, a concreta presença libertadora de Jesus no seu Espírito.
Jesus experimentou a perseguição, conheceu a dor e o sofrimento e, morrendo, abriu pela sua ressurreição um novo horizonte de vida. Com este Jesus as CEBs querem continuar o projeto do Reino de Deus.
As CEBs sentem-se impulsadas pelo Espírito de Deus, a quem Jesus chamava Abba, e com quem relacionou-se como Filho amado; nessa experiência de presença e abertura sentem-se interpeladas a escutar e acolher Deus na vida, nos acontecimentos do dia-a-dia e do mundo. Elas reconhecem os sinais dos tempos que o Espírito lhes segue indicando para continuar a missão. É a partir dessa dinâmica que as CEBs apropriam-se dos textos da Bíblia, buscando neles luz e força para reconhecer a vontade de Deus, o caminho que têm que seguir e as ações que devem implementar.
As CEBs são convocadas pela Palavra, que, para nós, cristãos e cristãs, é o mesmo Jesus Cristo. Reconhecem a continuidade dessa Palavra que se manifesta na realidade e que acontece com a força do Espírito. Assumem que a criação divina é um processo aberto e a semente da Palavra continua o agir na história nas diversas expressões da realidade como bem diz São Justino no século II e retomada pelo Concilio Vaticano II.
A Sagrada Escritura, Palavra de Deus, é um caminho onde pode se reafirmar hoje a esperança de um mundo onde mulheres e homens, jovens e crianças, vivam com dignidade no Amor.
As CEBs expressam sua fé através do anúncio e da denúncia profética, rompendo com as correntes injustas e assumindo a dimensão libertadora. Sua espiritualidade está encarnada nas realidades cotidianas onde experimentam a presença de Deus em suas vidas. Essa espiritualidade é vivenciada no seguimento de Jesus, a exemplo de Maria do Magnificat e se fortalece com o testemunho dos mártires, que são modelo de ação na defesa da vida e dos direitos dos pobres.
As CEBs se alimentam e celebram, unindo fé e vida em todas suas dimensões: econômica, social, política, cultural e ecológica; o fazem de forma festiva, criativa e participativa, fazendo memória pascoal de Jesus.
O caminho espiritual das CEBs é construído pelo compromisso vinculado com uma dimensão profunda da pessoa, de modo profético e libertador, abertas também ao diálogo ecumênico e inter-religioso na defesa da vida e o cuidado da Casa Comum. Sua espiritualidade se fundamenta na Páscoa de Jesus (Eucaristia) e se expressa compassiva e solidariamente com quem sofre na luta contra toda injustiça.
As CEBs vivem sua opção desde, entre e com os pobres, compartilhando as alegrias e dificuldades do dia-a-dia, na busca de uma sociedade sem desigualdade, injustiça e opressão. Os pobres conhecem o sofrimento mas sabem que Deus não os abandona nunca. A opção pelos pobres é teológica, cristológica, pneumatológica e eclesiológica. Como diz o Papa Francisco: “…a opção pelos pobres é uma categoria teológica antes que cultural, sociológica, política ou filosófica. Deus lhes outorga «sua primeira misericórdia». Essa preferência divina tem consequências na vida de fé de todos os cristãos, chamados a ter «os mesmos sentimentos de Jesus Cristo» (Fl 2,5)”. (EG 198)
Se faz necessário, como diz a Conferência de Aparecida, identificar quem são os pobres e todas aquelas pessoas que vivem nas periferias geográficas, culturais e existenciais (Cf. Aparecida 402); Eles são fruto de um processo de exploração e empobrecimento por um sistema injusto. Sofrem com o abandono por parte das estruturas sociais e políticas e, às vezes, pela própria Igreja.
As CEBs reconhecem a força histórica dos pobres e, da mesma maneira de Jesus, assumem suas causas, vendo neles os protagonistas das transformações estruturais da sociedade e apontando para um projeto que garante a vida plena em harmonia com a Mãe Terra.
As CEBs:
Buscam responder aos sinais dos tempos, ao denunciar a injustiça institucionalizada e o pecado social que mata a vida através de uma economia de exclusão, da idolatria do dinheiro que domina em vez de servir, gerando violência em contra dos pobres. (cf. EG 53-60).
Assumem que a luta social e ecológica é uma única luta, porque estão convencidas de que “Outro mundo é possível, urgente e necessário”. Isso implica uma tríplice mudança: pessoal, coletiva e estrutural. Não é possível, como diz o Papa Francisco, que haja famílias sem teto, sem trabalho e sem terra.
Participam e reforçam dos projetos alternativos, sustentáveis e equitativos apontando num novo modo de produção e consumo socioambiental.
Se identificam e assumem a proposta do Bem Viver, Bem Conviver, que vem dos povos originários e indica um estilo de vida e valores contrapostos ao atual sistema.
Procuram participar nas lutas dos movimentos sociais-populares e políticos que assumem o compromisso pela transformação estrutural.
Esse modo de ser e viver a Igreja e o anúncio de uma sociedade alternativa, é um processo inacabado, aberto ao Espírito até chegar aos céus novos e nova terra (Ap 21).
Tradução: Luis Miguel Modino
Contribuição: Francisco Orofino
Fonte:portal da Cebs